Os filmes de Akira Kurosawa sempre me chamaram muito à atenção, não só por serem considerados alguns dos melhores filmes de sempre, mas principalmente pelas histórias épicas ambientadas na época do Japão feudal. No entanto, o filme que escolhi para dar início a uma viagem pela sua cinematografia situa-se do lado oposto do espetro.

High and Low (1963) é um drama de crime com toques de thriller e mistério. A trama começa quando o filho de Kingo Gendo, um executivo de empresa de sapatos que se preparava para comprar ações e assumir controlo da empresa, é raptado e são pedidos ¥30M em resgate. A aflição de Gendo desaparece pouco tempo depois, quando o seu filho é encontrado são e salvo em casa - acontece que foi o filho do seu motorista que foi raptado. No entanto, apesar do engano, as exigências do sequestrador não mudam e Gendo vê-se num dilema: avançar com a compra da empresa, ou utilizar o último dinheiro que lhe resta para salvar o filho do seu motorista. A partir daí, chega a polícia a casa de Gendo e é lançada uma caça ao homem.

O primeiro ato do filme passa-se maioritariamente na casa de Gendo, com o foco nas conversas telefónicas entre Gendo e o sequestrador, e é aqui que o filme nos começa a agarrar. Constantes diálogos que nos revelam o dilema de Gendo e a sua situação financeira frágil. No início Gendo é nos mostrado como um homem frio e focado no seu sucesso (especialmente quando este está, inicialmente, relutante em ajudar o filho do seu motorista), mas ao longo deste primeiro ato a sua faceta muda e vemos o seu lado humanístico quando Gendo finalmente decide pagar o resgate. Apesar deste primeiro ato ser o mais parado, nunca por um segundo parece ser monótono. O constante back and forth entre Gendo e o sequestrador, a corrida contra o tempo para dar trace às chamadas e o começo de um plano sofisticado para ir à caça do sequestrador deixam-nos colados ao ecrã sempre à espera do próximo passo.

O segundo ato do filme é muito mais frenético. A caça ao homem já está lançada. Com constantes exposições de pistas e informações acerca do que ocorreu na data do rapto e de possíveis paradeiros do sequestrador, o filme não nos dá tempo para respirar nem para tirar os olhos um segundo que seja do que está a acontecer. A tensão é elevada ao máximo neste ato, e a pouco e pouco a peças do puzzle vão se juntando e começamos a perceber melhor não só o que aconteceu mas também os motivos do sequestrador. Um ato muito "metódico" e ainda assim frenético, que nos mostra passo a passo as várias fases da investigação, mas nunca de uma forma monótona ou que se arraste.

Por fim, o último ato foca-se mais no sequestrador e nos seus motivos. Com a polícia cada vez mais próxima, é nos dado uma pequena visão da vida do nosso criminoso. Ao contrário de Gendo, que vive na sua casa luxuosa no topo de Yokohama, o nosso sequestrador vive nos bairros pobres e degradados. Levando uma vida pacata como médico estagiário numa clínica, o sequestrador é movido talvez pela sua inveja e desprezo de Gondo, que leva uma vida luxuosa e sem preocupações. Um ato mais lento que o segundo, mas com riscos mais altos, um passo em falso pode deitar tudo a perder, para qualquer um dos lados. Esse risco nunca se deixa de sentir ao logo deste ato, cheio de voltas e reviravoltas. Quando achamos que é desta, afinal escapou algo. É um verdadeiro jogo do "gato e do rato" que nós deixa sempre a pensar "será que é desta?" "e a seguir?".

Com isto tudo, High and Low é um filme que nos agarra desde o primeiro momento e nunca mais nos larga. Com uma história super cativante e mostrada de uma forma que não nos permite largá-la, Akira Kurosawa conseguiu entregar uma obra de arte única e diferente de outros filmes do mesmo género. E no final de tudo, High and Low não é só mais um thriller ou drama criminal qualquer, é também uma exposição das diferenças entre o "Alto e Baixo" da sociedade japonesa da altura.